Confira 5 tendências que devem movimentar o mercado brasileiro de vinhos em 2023, ano que se inicia com a queda nas vendas da bebida.

O ano começou com muita adrenalina no campo da política e da economia e com os lojistas estocados em vinhos brancos e tintos. É também o primeiro ano com queda nas vendas de vinho desde o início da pandemia, e no qual o velho ditado chinês de que crise é sinônimo de oportunidade parece nunca ter sido tão verdadeiro.

Assim, 2023 começa com cautela, com o planejamento do ano sendo traçado a partir das primeiras decisões econômicas do novo governo e com as apostas sobre a política cambial. Há a sensação de que o ano só deve começar mesmo depois do Carnaval, retomando uma máxima que quase sempre foi verdadeira até a chegada da pandemia. Enquanto isso, é o momento de estudar as tendências e tomar as decisões que, espera-se, sejam certeiras para enfrentar os próximos 12 meses.

A bola de cristal, se existisse, seria um objeto bastante disputado para qualquer setor. Em especial no de vinhos, pela dificuldade de se traçar um cenário de longo prazo. Se voltarmos apenas 12 meses no tempo, havia certa incerteza no ar. No entanto, a expectativa era de consumo crescentes nos brancos, rosés e tintos. Mesmo nos cenários mais pessimistas, apontava-se para vendas estáveis.

O ano de 2022 terminou com redução de 6,2% no volume de vinhos importados e retração de 4,2% em valor (dólar).

Entretanto, o ano de 2022 terminou com redução de 6,2% no volume de vinhos importados e retração de 4,2% em valor (dólar), segundo a Ideal Consulting. Os dados das vinícolas brasileiras ainda não foram divulgados, mas as primeiras informações indicam queda de vendas no ano passado. Um ano atrás também era certa a explosão do e-commerce como plataforma para a venda de vinhos, enquanto hoje o foco maior é unir as experiências entre as compras online e presencial.

Mesmo com todas as incertezas, é possível apontar alguns caminhos que devem se destacar ao longo deste ano. Depois de conversar com importadores, especialistas em pesquisa de mercado e sommeliers, e analisar diversos relatórios sobre brancos e tintos, o blog da Winext destaca, em cinco tópicos, os caminhos que devem ganhar força no mercado de vinhos em 2023. Confira a seguir!

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Wine Intelligence aponta que os consumidores regulares vêm optando cada vez mais pelo vinho em taça quando vão aos bares, como alternativa a coquetéis, destilados e cervejas (crédito: Helena Lopes).

#1 - Novas frentes para descentralizar o consumo do vinho

Até muito recentemente, o vinho era a bebida do restaurante, escolhida para harmonizar com a gastronomia, enquanto nos bares reinavam os coquetéis e os destilados on the rocks. Mas o vinho vem encontrando nos bares, e não apenas nos wine bars, um espaço propício para expandir os domínios. Pesquisa da Wine Intelligence aponta que em 2022, 61% dos consumidores regulares de vinho pediram uma taça de branco ou tinto em bares, numa tendência de crescimento. Degustar uma taça de vinho no balcão é uma experiência que vem ganhando novos adeptos.

Os novos pontos de consumo aparecem sem fazer grande alarde, mas chama atenção até a quantidade de bares de praia que ofereceram a bebida muito mais em garrafas do que nas latinhas – essa, aliás, uma tendência que parece que foi, ao menos por enquanto, apenas um modismo. Outro espaço para os vinhos, agora virtual, são os aplicativos, que vem se abrindo cada vez mais à venda de garrafas. Aqui, o melhor exemplo é o Zé Delivery, da Ambev, que começou com os rótulos da argentina Dante Robino e continua crescendo.

O consumo de vinho vem correspondendo ao perfil da nossa população, deixando de ser uma bebida majoritariamente para o público masculino.

A presença ainda é pífia quando comparada à cerveja. Mas o que se percebe é que o consumo de vinho vem correspondendo ao perfil da nossa população, deixando de ser uma bebida majoritariamente para o público masculino. Se as mulheres são a maioria da população, agora o consumo da bebida também é maior para ela do que para ele.

Mas o vinho, ao contrário da cerveja, ainda tem seu consumo concentrado nas classes mais abastadas, e não naquelas que representam a maioria da população. Estudo da consultoria inglesa IWSR indica crescimento das cervejas em mercados chave – e o Brasil é um deles –, impulsionado pelos investimentos no on-trade e no e-commerce. Alinhado com essa tendência, a comercialização nos pontos de dose do Brasil contribuirá com os maiores volumes para a categoria de cerveja nos 20 principais mercados de bebidas alcoólicas até 2026.

Em mais um passo na consolidação de sua estratégia phygital, a Evino investiu 2 milhões de reais na abertura de sua primeira loja física, em Pinheiros, São Paulo (crédito: Evino).

#2 - Vale a compra online ou a presencial?

Aqui, a resposta já é clara: ambos. Ou melhor, uma união das duas possibilidades. É certo que a pandemia impulsionou de forma significativa o crescimento do comércio eletrônico de brancos e tintos. A expectativa é de que este comércio contribua com mais de US$ 10 bilhões para o setor de bebidas alcoólicas entre 2021 e 2026, atingindo quase US$ 40 bilhões até 2026, nos 16 mercados-foco, o que inclui o Brasil, segundo a IWSR.

Mas também é certo que o arrefecimento da pandemia levou a uma vontade (ou seria necessidade?) de comprar vinhos presencialmente. A consequência é que as empresas vêm se debruçando para oferecer modelos de vendas, ou melhor, de experiências, que englobem as duas possibilidades.

A jornada digital está mais presente do que nunca, mesmo com o consumidor voltando às lojas físicas.

A nova loja da importadora Evino é um exemplo. Com diversas atrações visuais modernas, o espaço permite ao consumidor provar o vinho de maneira presencial ou definir a compra online e vice-versa. “Queremos entregar uma jornada mais conectada”, diz Ari Gorenstein, diretor de produto da Víssimo, holding que engloba a importadora Grand Cru e o e-commerce Evino. Traduzindo, a ideia é unir toda a expertise do mundo digital, que veio da Evino, com a do varejo físico da Grand Cru.

Mas isso não é exclusividade desta holding, é o caminho que as empresas do setor estão traçando. Sabem que a jornada digital está mais presente do que nunca, como diz Gorenstein, mesmo com o consumidor voltando às lojas físicas. A questão aqui é azeitar esta engrenagem, garantindo que o consumidor tenha realmente uma boa experiência entre estes dois canais de venda.

Dos espumantes, aos rosés e doces, novos tipos, estilos e varietais de vinho vêm conquistando o paladar dos consumidores e trazendo mais diversidade à mesa dos brasileiros (crédito: Hari Nandakumar)

 #3 - Espumantes, brancos, rosés e aqueles goles mais açucarados estão em alta

Não é novidade que o vinho foi a bebida da pandemia e agora os espumantes aparecem como a categoria que vai brilhar no cenário pós-covid. Se no início da crise não havia ânimo para abrir uma garrafa destas bebidas borbulhantes, agora há muito espaço para elas. Há desde a retomada das festas, a melhora na qualidade da bebida e até a maior conscientização de que estas bebidas não são restritas às comemorações e podem ser apreciadas em várias situações de consumo.

O aumento do consumo dos espumantes é acompanhado pelo crescimento dos vinhos brancos e rosados. “Brancos e rosés vem ganhando participação de mercado e devem chegar a patamares mais compatíveis com mercados mais maduros”, acredita Adilson Carvalhal Júnior, diretor da Casa Flora Importadora e presidente BFBA, associação que reúne os importadores de vinho.

Gorenstein, por sua vez, aposta no crescimento do consumo de vinhos elaborados com uvas não tão conhecidas pelos consumidores. Pinot Giglio, Riesling, Vermentino e até a Torrontés são algumas delas. Nos rosés, também influencia no crescimento do seu consumo o fato de ser uma bebida “instagramável”, neologismo hoje auto-explicativo.

O consumo tenda a ser um pouco mais bem distribuído entre as categorias, com o aumento da participação dos espumantes, brancos e rosados.

Neste xadrez de categorias, não significa que o tinto deve perder relevância, destaca Junior. A percepção é de que o consumo tenda a ser um pouco mais bem distribuído entre as categorias, com o aumento da participação dos espumantes, brancos e rosados. E nos tintos, ainda destaca Junior, tem um espaço para crescer aqueles estilos de bebidas mais leves. “O tinto continua líder da categoria”, diz o diretor da Casa Flora.

Outra categoria que merece atenção é a dos vinhos mais doces. A começar pela dos Red Blend, que faz sucesso nos Estados Unidos e por aqui tem na marca da Concha y Toro o seu maior representante. São vinhos tintos em que as uvas utilizadas em seu blend são mantidas em segredo, em um estilo com alto açúcar residual – leia-se tintos muito frutados e quase doces. Ainda não está claro se será um modismo ou uma tendência. Na linha dos docinhos, ainda, estão rótulos elaborados com uvas com maior sensação de dulçor e que ajudam na migração dos consumidores do vinho de mesa para os finos como os moscatéis.

Aqui sempre vale lembrar que os vinhos de mesa, aqueles elaborados com variedades não viníferas, predominam no Brasil. No acumulado de janeiro a setembro do ano passado, por exemplo, o mercado se dividia entre 57% de participação dos vinhos de mesa; 7% dos vinhos finos brasileiros e 36% dos importados, nos dados da Ideal Consulting.  

Projeto “Tão Longe, Tão perto”, de Gabriela Monteleone, é uma das iniciativas que incentiva a valorização do vinho nacional, divulgando o trabalho de produtores artesanais de todo o país (crédito: Priscila Darré/Divulgação).

#4 - O maior consumo do vinho brasileiro continua no pós-pandemia?

Entre o final de 2020 e início de 2022, não havia produtor brasileiro que não reclamasse de problemas de matéria-prima, principalmente a falta de garrafas e de embalagens. Isso aconteceu pela demanda crescente e inesperada pela bebida em todas as suas faixas de preço. Hoje, os problemas de logística já foram superados. Ao mesmo tempo, pandemia deu a oportunidade para o consumidor conhecer melhor a bebida nacional e, consequentemente, diminuir o seu preconceito em relação à bebida.

Agora chegou a hora de saber se os vinhos brasileiros souberam aproveitar esta onda positiva. “A venda da pandemia foi uma bolha”, afirma o produtor Luís Henrique Zanini, conhecido pelo projeto Era dos Ventos. O próximo passo é fidelizar esses consumidores, que caiu quase de paraquedas, muitos na procura de rótulos mais baratos e de qualidade para o consumo doméstico, que provaram e aprovaram a sua qualidade. Diversas ações devem surgir nesta perspectiva.

Em crescimento, o enoturismo aparece como uma ferramenta promissora e que permite ao produtor se apresentar direto ao consumidor.

“O desafio é saber fomentar o acesso ao vinho brasileiro”, afirma a sommelière Gabriela Monteleone, do projeto Tão Longe, Tão Perto. Para ela, o foco também precisa estar nos pequenos produtores nacionais e este é um desafio para este ano. Nesta fidelização, o enoturismo, também em tendência de crescimento, aparece como uma ferramenta promissora e que permite ao produtor se apresentar direto ao consumidor, sem precisar disputá-lo nas gôndolas dos supermercados.

Pode, ainda, ajudar o vinicultor brasileiro a boa recepção que o Brasil vem tendo no exterior. Inclusive porque agora há uma maior variedade para ser exibida, ao contrário do período da Copa do Mundo e das Olimpíadas no Brasil, quando quase só havia vinho gaúcho. O câmbio é um bom aliado, ao tornar os rótulos nacionais mais competitivos em preços.

Apesar do retorno das viagens internacionais pós-pandemia, o trade brasileiro espera que a venda de rótulos de categoria premium siga em crescimento (crédito: ISawRed).

#5 O impacto do orçamento mais apertado nos vinhos premium

É fato que 2023 será de orçamentos familiares mais apertados. Ao mesmo tempo, o ano segue com a grande procura pelas passagens aéreas internacionais. “É quase impossível fazer previsão no Brasil”, conta Ciro Lilla, dono da importadora Mistral. Mesmo assim, o importador se diz animado com a venda de rótulos de maior valor, que ganhou força durante a pandemia.

Sua análise é que seus pares e a própria Mistral já absorveram o impacto daqueles rótulos que chegam na mala dos viajantes, com a volta das viagens internacionais. “Sempre terá o consumidor que viaja e traz muito vinho”, destaca ele. E acrescenta que o crescimento da venda destes vinhos de maior valor deve continuar, seja porque o consumidor gostou e decidiu comprar uma nova garrafa, seja porque precisa dar de presente a amigos.

Para consumidores com menor poder aquisitivo, o consumo deve ficar nos rótulos mais simples, principalmente do Chile e da Argentina.

Para 2023, a melhor notícia, diz Lilla, é o frio inesperado, que deve marcar o ano. “Desde maio de 2022, não temos uma semana inteira de calor, e isso motiva a venda de vinhos”, conta ele, que vive em São Paulo. “O clima maluco dos últimos meses ajuda a vender vinho”, acrescenta. Do lado daqueles que têm menor poder aquisitivo, o consumo deve ficar, principalmente, nos rótulos mais simples, principalmente do Chile e da Argentina. “O Chile deve ganhar consumidores”, exemplifica Felipe Galtaroça, da Ideal.

Apesar das tendências positivas, segue fundamental a cautela com o cenário de incertezas na economia e na política. Diante de inflação e dólar alto, a principal expectativa é de que a maioria dos consumidores siga optando pelo seguro: os rótulos mais reconhecidos, pelo melhor custo-benefício nas prateleiras.

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Foto de capa: Karsten Würth on Unsplash