Um tema recorrente quando falamos de marketing do vinho é a necessidade dos produtores de se promoverem eficientemente: comunicarem ao trade e ao consumidor, de preferência de forma inspiradora, sua individualidade. Em outras palavras, o que os diferencia de sua concorrência.
Esse processo pode ser resumido em uma palavra: branding. Esse é um termo que pode causar calafrios em grande parte da nossa indústria e está frequentemente relacionado a grandes corporações ou ao predomínio do estilo sobre o conteúdo. Para eles esse conceito vai contra a natureza artesanal do mundo do vinho. Aqui uma visão interessante de Jamie Goode sobre os branded wines versus estate wines em seu artigo "the two cultures".
É claro que poucos produtores possuem os recursos para se comunicar com seus consumidores como grandes marcas em outros segmentos. Mas se ater a isso é puro reducionismo.
Em certo sentido, branding também é fazer o “feijão com arroz” bem feito: definir o seu segmento, sua concorrência, conectar a sua oferta a um público-alvo, desenvolver uma apresentação que faça sentido para o seu consumidor e montar uma estratégia de comunicação que seja interessante e relevante para sua audiência.
E por que se preocupar com isso?
Quando alguns produtores afirmam que se fizerem um “bom vinho” os clientes virão como consequência, logo devemos nos perguntar: por que se arriscar caso isso não ocorra? Por que passar por todo o périplo no vinhedo e na cantina para produzir um vinho que você se orgulhe, e aí falhar em dizer as pessoas que ele existe em uma maneira que eles fiquem tentados a prová-lo e pagar o preço a que você se propõe? Basicamente isso é o branding.
O que o bom branding faz é assegurar que se possa cobrar mais por um produto do que se não nos preocupássemos com isso. Preço justo é aquele que alguém se propõe a pagar, não o quanto o produtor acha que vale. Os consumidores (e o trade, é claro) precisam ser convencidos, seduzidos, tocados. Poucas vezes fazemos escolhas racionais de consumo e, em se tratando de um gênero que não é de primeira necessidade em uma categoria tão diversa como a do vinho, nossas escolhas tendem a ser ainda mais movidas pelos nossos caprichos.
Em sua essência branding implica em ter controle sobre o seu próprio destino e, como apontado acima, qualquer produtor tem condições de fazer isso em um nível básico. Um vinho com um rótulo atrativo, um estilo alinhado a sua proposta e comunicado de uma forma clara e que envolva seu público consumidor, seguramente irá vender mais e melhor do que se não tivesse esses atributos. Não há provas contra isso.
Branding genérico ou regional
No entanto, uma área sobre a qual não há nenhum controle é o comportamento dos seus concorrentes. Enquanto produtores podem individualmente proteger a sua reputação, a percepção da qualidade de sua região está totalmente fora do seu controle.
As implicações disso são significativas. Enquanto a maior parte dos consumidores não possui uma impressão formada sobre determinada região, alguns, principalmente os de maior envolvimento, terão ideias pré-concebidas a respeito das particularidades regionais. E isso afetará os produtores individualmente. O mesmo vale para o trade.
Um dinâmico produtor de Pinot Noir da Bulgária seguramente terá menores chances de assegurar seu posicionamento do que um produtor similar da Borgonha, mesmo que ele possua uma boa marca e o vinho seja considerado de qualidade excepcional. Fato é que a marca Borgonha é mais forte que a marca Bulgária.
Isso significa portanto que bons produtores de regiões de menor prestígio estão em desvantagem pela sua reputação regional ou nacional. Isso pode estar associado a percepção, racional ou irracional, de baixa qualidade ou um “estilo inadequado” por razões como serem promovidos em excesso no passado (temos vários exemplos no nosso mercado como: vinhos alemães, beaujolais, prosecco e etc.)
Em certos casos, um produtor pode optar por não fazer nada a respeito e remar contra a maré, focando na sua qualidade individual, personalidade e força de marca para alcançar seus objetivos. Uma alternativa, no entanto, é se juntar a alguns pares com filosofias parecidas, e desenvolver uma identidade regional que, se bem sucedida, irá lhe distanciar do problema e criar um efeito positivo. Essa não é uma tarefa simples e quanto amais agentes envolvidos, mais difícil será de criar uma unidade em torno de uma causa. Algumas associações como a agência de promoções de vinhos de Rioja vem fazendo isso de forma bastante eficiente e consistente (veja aqui).
Igualmente importante é a necessidade de comunicar ao trade e seu consumidor as razões para comprar da sua “associação”. O que é claro nos traz de volta ao branding. O processo é mais complexo para regiões, mas o racional é exatamente o mesmo das marcas individuais.
Resumo
Tudo de fato nos remete ao branding. Como produtor individual ou uma região em uma mercado tão diverso e pulverizado como o vinho, o consumidor e o trade devem ser constantemente lembrados não apenas da sua existência mas que seu vinho deve ser comprado por um preço rentável.
Apenas um branding eficiente, associado a um processo de produção adequado e o uso das ferramentas de vendas e marketing, podem garantir a um produtor ou região a sensação de ter ao menos algum controle sobre o seu destino. E as capacidades de construção de marca, ou branding, são frequentemente as mais relegadas no nosso meio.
Sem uma marca forte um produtor é apenas um negociante de commodity, inteiramente sujeito às vicissitudes da sorte ou ao comportamento do segmento em que ele está inserido. E em um mercado altamente fragmentado, extremamente competitivo e de margens cada vez mais apertadas como o do vinho esse não é um bom lugar para estar.
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Nota: O artigo acima foi adaptado da matéria publicada na revista Harpers por Mike Paul (aqui na íntegra).
Foto: Patrick Schöpflin | Unsplash